Desafiador e ao mesmo tempo gratificante. Essa é a avaliação da equipe de técnicos da CPRM que participaram da campanha para instalação de duas estações de monitoramento no Rio Amazonas. A primeira com GPS e réguas de medição vai coletar dados sobre o nível de água. Já a segunda estação vai coletar informações sobre temperatura, unidade e radiação solar. Os dados vão ajudar a validar informações obtidas por dois satélites que cruzam a região e a decifrar a dinâmica fluvial do Rio Amazonas.
A expedição durou uma semana - 13 a 20 de outubro - e o Informe CPRM acompanhou de perto os desafios enfrentados pelos profissionais que atuam na Superintendência de Manaus, responsável pelo suporte logístico e operacional da expedição, que contou com a participação de pesquisadores da Comunidade Europeia. Essa iniciativa é fruto de um acordo de cooperação internacional firmado entre a CPRM, o instituto Francês IRD, e a Universidade Estadual do Amazonas (UEA), que juntos desenvolvem projeto sobre a dinâmica fluvial do Rio Amazonas.
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Montagem das regras de medição às margens do Rio Amazonas
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“Esse estudo inédito busca estabelecer uma nova metodologia que será referência para medição de grandes rios no mundo”, explica o pesquisador francês Estephane Calmant. Segundo Calmant esse projeto de pesquisa científica faz parte do programa de monitoramento do meio ambiente da Comunidade Europeia. Ele destaca ainda a importância da parceria com a CPRM. “Essa parceria é única no mundo que faz a validação de dados obtidos por satélites”, informa o pesquisador.
O chefe da Divisão de Hidrologia Aplicada, Achiles Monteiro, acredita que o estudo, além do reconhecimento da comunidade científica internacional, traz resultados concretos, pois ajuda a dar mais confiabilidade ao sistema de alerta contra cheias que a CPRM opera na região amazônica. “Essa pesquisa sobre a dinâmica fluvial que está sendo realizada em parceria com o IRD e a UEA reforça a atuação da CPRM na área de hidrologia”, avalia.
Influência do Rio Amazonas - O pesquisador francês explica que o Rio Amazonas indiretamente influência a vida no planeta. “A massa de água no período das cheias muda a gravidade da Terra e a órbita dos satélites”, diz. “Por isso é importante compreender a variação do nível de água do Amazonas, que representa 20% do volume de água doce do mundo.” Calmant diz que o local escolhido para instalação das estações de monitoramento é estratégico. “Aqui dois satélites se cruzam: o Saral e o Jason II. No ano que vem outro satélite, o Sentinela III será lançado para ajudar nesse trabalho de monitoramento”, avisa. Calmant destaca que essa é a quinta estação de monitoramento, instalada na Amazônia. Outras quatro já estão em operação: Iranduba e Santa Luzia do Bananal (Solimões); Urucurituba do Madeira (Madeira); Iracema, e agora, Bom Sucesso (Amazonas).
Intercâmbio - Segundo Monteiro o acordo prevê o intercambio de pesquisadores entre o Brasil e a França, além da troca de informações. Nos próximos dias, a química de Manaus Nilda Pantoja viaja para Toulouse, na França, onde vai passar três semanas em treinamento no laboratório de Geociências, Meio Ambiente e Terrestre (GET). “Essa parceria dá mais expertise aos nossos profissionais que atuam na área de hidrologia”, diz Monteiro.
A campanha - A bordo do barco Samara Lopes partimos de Manaus descendo o Rio Amazonas em direção ao local escolhido para montagem das estações de monitoramento. Após seis horas de navegação, já escurecendo, atracamos num barranco na margem esquerda, próximo ao povoado de Bom Sucesso, onde estabelecemos nossa base de operação. A rotina da equipe era puxada. Às cinco horas da manhã todos já estavam de pé. Debaixo do sol escaldante no coração da floresta onde a logística é complicada, a comunicação precária, e o clima é um enigma - calor quase insuportável e chuvas tropicais - o que, torna o trabalho da equipe árduo e o desgaste físico inevitável
Areia, cimento, pedras, madeiras e os equipamentos foram transportados nas costas, do barco - por cerca de 1 km - até o alto de um morro, onde as estações foram montadas, as réguas de medição foram instaladas logo nos primeiros dias, nas margens do rio. O trabalho de “formiguinha” descendo e subindo morro com material nas costas; o barulho de furadeiras e marteladas só parava depois das 18 horas, quando a equipe se recolhia no barco para jantar e dormir em redes improvisadas no convés.
Entretanto, o descanso era interrompido pelos banzeiros feitos por navios de carga que navegavam pelo rio e faziam o barco tremer a todo instante, sem falar nos temidos carapanãs, mosquitos sugadores de sangue e vetores de dengue e malária, que atacavam sem piedade a equipe durante ao entardecer.
A expedição era formada por quatro profissionais da Superintendência de Manaus: Alice Amorim, técnica em geociências e os auxiliares de campo, Manoel da Graças, Marcus Barreto e Alex Silva. O chefe da Divisão de Hidrologia Aplicada, Achiles Monteiro era coordenador da campanha, composta ainda pelos pesquisadores franceses Estephane Calmant, Jean François e Pascal Bamnefond, além do grego Estelius Mertikas. A prestativa tripulação do Samara Lopes era comanda pelo experiente comandante José Ferreira.
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Alice Amorim trabalha há 16 anos nos rios da região |
Mulheres em ação - Alice Amorim conhece os rios da Amazônia como poucos. É uma verdadeira amazonas da mitologia grega que há 16 anos percorre os rios, Negro, Amazonas e Solimões, coletando dados e fazendo a manutenção das estações que a CPRM opera na região. Única mulher da equipe, ela carrega pedras e areia, ajuda a furar buracos e a fazer as medições para montagem das regras nas margens do rio. “O Amazonas é uma grande avenida por onde navegam canoas, barcos, balsas e navios. Conhecê-lo melhor é um desafio”, diz Alice, que chega a ficar até vinte dias viajando pelos rios da região.
Orgulho em contribuir com a ciência – O orgulho de participar de uma pesquisa científica que vai produzir conhecimento que será utilizado para ajudar a população de ribeirinhos e das grandes cidades que vivem as margens do Amazonas a se prevenirem melhor para enfrentar as cheias inerentes da região “torna esse trabalho cansativo em gratificante”, diz a Alice.
O auxiliar de campo Marcus Barretto, compara seu trabalho ao de “formiguinha”, mas que no final, faz a diferença. “É um trabalho braçal que requer muito esforço, sem contar o tempo que gente fica longe da família. Mas é gratificante saber que estamos ajudando a salvar vidas e contribuindo com a ciência”, avalia Barretto.
Observadores – Achiles Monteiro diz que a CPRM mantém mais de três mil observadores no país, só na Amazônia são mais de 600 que cuidam das estações. Eles recebem treinamento e orientações de como anotar o nível do rio e colher amostras dos pluviômetros. Por ano são investidos cerca de R$ 12 milhões de reais na operação da rede de monitoramento. Esse dinheiro movimenta a economia regional, pois é utilizado para compra de material, aluguel de embarcações e pagamento de contribuição aos observadores.
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Observadores que vão cuidar das estações
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Os observadores Rivanildo Ferreira e Moisés Teles, ribeirinhos da comunidade de Bom Sucesso estão ansiosos para começar a participar do projeto. “Nosso conhecimento da natureza vai ajudar na coleta de informações sobre o nível do rio”, diz Rivanildo. “Vamos explicar a importância dessas estações para nossa comunidade”, destaca Moisés. Rivanildo diz que as cheias são importantes porque ajudam a fertilizar o solo de áreas de várzea próximas ao rio, onde eles plantam milho, mandioca e feijão. “Pra nós é importante saber até que ponto o rio vai subir“, avalia o ribeirinho que agora será um multiplicador de conhecimento.